Carta Política do 7º Encontro de Agricultoras e Agricultores Experimentadores, do Terreiro de Inovações Camponesas e da Feira da Agrobiodiversidade no 13º CBA

Agroecologia, convivência com os territórios e justiça climática

Esse lema do 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA) orientou as reflexões do 7º Encontro Nacional de Agricultoras e Agricultores Experimentadores, realizado entre os dias 15 e 18 de outubro de 2025. Promovido pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) no âmbito do CBA, o encontro foi construído em conjunto com o Terreiro de Inovações Camponesas e a Feira da Agrobiodiversidade, espaços que se entrelaçam, tecendo vivências de trocas de experiências, sementes, saberes e inovações. Somos mais de 500 agricultoras e agricultores familiares, juventudes rurais, povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, pesquisadoras, pesquisadores, extensionistas, organizações da sociedade civil e representantes do poder público, todos e todas reafirmando que a inovação nasce nos territórios e deve ser reconhecida como um bem comum.

Em um momento em que o Brasil sai novamente do Mapa da Fome e as mudanças climáticas colocam as sociedades modernas à beira de colapso reafirmamos a necessidade de reorientação das trajetórias de inovação nos sistemas agroalimentares seguindo o paradigma agroecológico. Esse é o sentido profundo da convivência com os territórios, uma noção ao mesmo tempo técnica e política que ressalta o protagonismo de agricultoras e agricultores nos processos de inovação sociotécnica.

As experimentações e inovações camponesas têm raízes profundas: há mais de 12 mil anos, o manejo da agrossociobiodiversidade e o melhoramento de variedades alimentares constituem a base das agriculturas do mundo. As sementes crioulas carregam em si o rio da história de agricultoras e agricultores, de povos, de culturas e da força da coletividade. A defesa da soberania genética e alimentar está intimamente ligado ao reconhecimento das guardiãs e dos guardiões de sementes e tradições, e das capacidades de agricultoras e agricultores experimentadores de desenvolver a partir de suas realidades, necessidades e modos de vida, de produção e de consumo, compatíveis com os desafios sociais e ecológicos do presente momento histórico.

As invenções apresentadas no Terreiro das Inovações Camponesas — plantadeiras de baixo custo, sistemas de reúso de água, painéis solares acessíveis, bioinsumos, guardiões(as) de sementes, miniagroindústrias comunitárias, entre tantas outras — expressam a capacidade de co-criar soluções que unem conhecimentos populares, tradicionais e científicos, respondendo às necessidades da produção de alimentos saudáveis, do cuidado com os biomas, da geração de renda, promoção da saúde coletiva e redução das desigualdades.

Portanto, uma significativa mudança de enfoque dos processos de pesquisa e inovação é necessária para que esse potencial não reconhecido da inovação camponesa seja desbloqueado e desenvolvido. No entanto, persistem barreiras estruturais que limitam o potencial transformador da inovação agroecológica: subfinanciamento crônico, editais escassos e burocráticos, invisibilidade institucional do conhecimento produzido por mulheres, juventudes, povos indígenas e comunidades tradicionais, falta de infraestrutura e centros tecnológicos inclusivos, a centralidade na materialidade das experiências e não nas famílias agricultoras protagonistas, além da pressão de megaprojetos sobre os territórios e
da fragmentação entre ciência, extensão e crédito rural.

Reivindicamos a consolidação de um ecossistema nacional de inovação agroecológica, orientado por governança participativa e paritária, com presença efetiva de organizações sociais nos espaços decisórios, fomento continuado e desburocratizado, integração entre ensino, pesquisa, extensão e territórios, e prioridade orçamentária para máquinas, equipamentos, bioinsumos, agroindustrialização familiar, saneamento rural e energias renováveis descentralizadas. É essencial também assegurar a participação do Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) no Comitê Gestor do CT Agro, de modo que a agricultura familiar e a transição agroecológica sejam plenamente contempladas nos investimentos estratégicos em ciência, tecnologia e inovação, em conformidade ao Programa Nacional de Pesquisa e Inovação para Agricultura Familiar e Agroecologia (PNPIAF).

Defendemos a criação de um Fundo Nacional de Inovação para a Agricultura Familiar e a Agroecologia, com recursos estáveis e plurianuais, que articule bancos públicos, fundos constitucionais e cooperação internacional. É necessário simplificar normas, oferecer assistência para a elaboração de projetos e criar mecanismos de crédito diferenciados, como fundos rotativos, garantias solidárias e outros instrumentos que possam se articular com redes nacionais e internacionais, apoiando negócios sociobiodiversos e infraestrutura
comunitária. O monitoramento deve ser transparente, priorizando soluções resilientes a partir dos territórios, inclusão socioprodutiva, serviços ecossistêmicos e segurança alimentar e nutricional.

A transição agroecológica exige compromisso político e financeiro. É dever do Estado reconhecer que não haverá soberania e segurança alimentar, nem resiliência climática, sem investir na inovação que emerge dos territórios.

Convocamos governo federal, Congresso Nacional, agências de fomento, bancos públicos, universidades, centros de pesquisa e cooperação internacional a somarem esforços para consolidar um sistema de inovação para a agricultura familiar que seja participativo,
democrático, agroecológico e feminista.

Por uma agricultura e uma alimentação que cuidam do clima, da saúde dos biomas e da diversidade de saberes e culturas e da democracia.

Articulação Semiárido Brasileiro (ASA)
Associação Brasileira de Agroecologia (ABA-Agroecologia)

13º Congresso Brasileiro de Agroecologia
Juazeiro (BA), outubro de 2025.

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