É com grande alegria que apresentamos o Caderno Síntese dos Processos dos CBAs. Esta publicação é resultado das sinergias estabelecidas entre a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), a Comissão Local responsável pela organização do 12o Congresso Brasileiro de Agroecologia (Rio de Janeiro-RJ, 2023) e o Projeto Desaguar de Memórias, Sistematização e Aprendizados do 12o CBA. É fruto também das experiências acumuladas nos 20 anos da Associação.
Desde sua fundação, em 2004, a ABA Agroecologia participa, enquanto uma associação científica, do debate público brasileiro, adotando uma perspectiva crítica em relação ao modelo de produção e ocupação territorial que norteou o desenvolvimento agrícola e agrário nacional, caracterizado pelas grandes monoculturas de exportação, formas predatórias de exploração do trabalho humano e persistentes desigualdades no acesso à terra, à água e a biodiversidade. Em aliança com diferentes organizações, busca potencializar, através de sua atuação institucional, referenciais de pesquisa e de produção de conhecimentos, metodologias, estratégias de ação coletiva e modos de viver, fortalecendo a Agroecologia nos mais diferentes contextos.
Nesse cenário desafiador, a ABA tem procurado exercitar uma concepção multidimensional da Agroecologia, como ciência, movimento político e prática social, “portadora de um enfoque científico, teórico, prático e metodológico que articula diferentes áreas do conhecimento de forma transdisciplinar e sistêmica, orientada a desenvolver sistemas agroalimentares sustentáveis em todas as suas dimensões”, em permanente diálogo com os atores sociais que constroem a agroecologia. Trata-se de desenvolver conceitos, métodos e estratégias visando restabelecer as conexões existentes entre ciência e ação pública articulando, em novos moldes, o ensino, a pesquisa e a extensão. Para isso, torna-se necessário, enfrentar as inúmeras contradições que atravessam a prática de uma ciência popular, crítica, criativa e contextualizada, em um esforço permanente no sentido de reconstruir os nexos existentes entre o conhecimento acadêmico e o mundo da vida, posicionando os processos de produção do conhecimento em uma nova paisagem material, ética, política e cultural.
Fomos aprendendo, nessa trajetória, que repensar a ciência envolve, entre muitas coisas, rever os métodos que escolhemos para produzir e partilhar conhecimentos. Nesse caminho, há sete anos atrás, como um desdobramento do Projeto de Sistematização dos Núcleos de Agroecologia – construído pela ABA-Agroecologia e apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) entre 2015 a 2017, – lançamos a primeira edição do “Caderno de Metodologias – Experimentações e Caminhos na Construção do Conhecimento Agroecológico”. Em 2017, 28 fichas foram elaboradas como uma forma de partilhar as diferentes atividades, processos e tecnologias pedagógicas e participativas exercitadas nesse projeto. Metodologias que foram construídas e exercitadas coletivamente, em mais de 34 oficinas, caravanas e seminários de sistematização animados pela ABA-Agroecologia naqueles anos.
Através da presente publicação, lançada exatamente um ano após a realização do CBA no Rio de Janeiro (2023), procuramos dar sequência a esse esforço coletivo de sistematização e reflexão metodológica, lapidando a inteligência coletiva que estrutura os fazeres relacionados, de forma mais direta, à organização dos CBAs. Durante a organização do 12º CBA, buscamos conectar as lições aprendidas no último Encontro Nacional de Agroecologia (IV ENA), realizado em Belo Horizonte, com os acúmulos das três últimas edições dos CBAs: Belém (2015), Brasília (2017) e Sergipe (2019).
O esforço no sentido de reconhecer o que já havia sido feito gerou na Comissão Local do Rio de Janeiro um desejo de que a experiência de execução das comissões que estruturam o Congresso pudesse ser sistematizada e partilhada, de modo que os novos começos pudessem ser mais estimulantes e estruturados, proposta que foi acolhida pela Diretoria da ABA-Agroecologia. O trabalho desenvolvido pelas Comissões, na construção dos diferentes ambientes do Congresso, que reuniu mais de 4.700 participantes inscritos, com apresentação de inúmeros trabalhos.
Reafirmamos que essa é uma publicação que nos parece importante para a memória da Associação, sendo resultado de muita dedicação e trabalho que entre tantas direções, poderá contribuir na preparação do próximo CBA e além. Sua elaboração é fruto do esforço das várias comissões que compuseram a última edição do Congresso e sabemos que não tivemos o tempo necessário para fazer uma reflexão mais coletiva sobre termos, processos, nomenclaturas, objetivos e inúmeros outros detalhes que não são pequenos. Não existe na ABA-Agroecologia uma única compreensão sobre o que são os CBAs, qual sua relação entre Ciência e Práticas Agroecológicas e outras tantas questões.
Na ficha técnica do material, vocês poderão consultar quem foram as pessoas que buscaram sistematizar impressões, olhares e aprendizados dentro de cada metodologia/ficha. Essas pessoas buscaram traduzir os acúmulos de tantas outras pessoas que trabalharam, pesquisaram e foram encontrando caminhos para sintonizar práticas, ideias e discursos dentro de um contexto limitado de tempo, espaço e recursos.
Destacamos ainda a definição em torno do que é um Congresso da ABA-Agroecologia, o que temos expresso aqui são narrativas acumuladas nas últimas edições, mas sabemos que neste momento, onde celebramos os 20 anos da Associação, a própria concepção do que é um CBA está, ao mesmo tempo, em construção e revisão. Apostamos que os Congressos da ABA-Agroecologia carregam como eixo central a construção do conhecimento agroecológico.
Além dos textos introdutórios, ao todo são 40 fichas com sínteses metodológicas que chegam como legado da nossa memória e produção conjunta no movimento agroecológico, e na produção de Congressos, tendo como principal referência o 12o CBA, realizado na cidade do Rio de Janeiro, nos dias 20 a 23 de novembro de 2023 . A escolha de costurar experiências, escutar quem já fez e organizar adaptações e propostas a partir das últimas edições permitiu que as intenções, procedimentos e cuidados relacionados aos ambientes e processos dos congressos promovidos pela ABA-Agroecologia pudessem ser recuperados.
Apostamos nas “fichas-síntese” enquanto estratégia intencional de partilha, comunicação e prática, compreendendo-as como produto de intensos processos de sistematização, escuta, partilha, resumo, priorização e visibilização dos esforços feitos por um conjunto de pessoas comprometidas com a “feitura das coisas”. Elaborar textos reflexivos, densos e recheados de conteúdo poderia afastar esse material de um conjunto de pessoas que ainda está distante das práticas convencionais acadêmicas de pesquisa, reflexão e leitura. Dessa forma, optamos por partilhar pequenas pílulas, temperos, para o que já é feito em cada lugar-espaço-comissão. Assim como dissemos no primeiro volume (2017), não há forma única, fechada e controlada de fazer o que fazemos no campo da produção do conhecimento agroecológico. Os processos educativos são, antes de tudo, processos de encantamento, e esperamos que essas fichas possam servir como inspiração e contribuição para novos movimentos. Como gostamos de dizer, parte é intencional, e parte é fruto da potência de cada lugar, cada história, cada coletivo e as trajetórias que vamos tecendo no cotidiano da vida.
Fazemos os CBAs porque acreditamos na força dos encontros e na construção de soluções para as múltiplas crises societárias, a partir do diálogo entre os coletivos e movimentos populares, pois acreditamos que a universidade e a educação são direitos. Fazemos CBAs, porque sabemos da seriedade da ciência crítica, comprometida e contextualizada, mas também de que ela é feita de celebração, festa, fé e magia. Um dos compromissos deste material é aperfeiçoar e suavizar os caminhos percorridos para a realização de um Congresso até outro, inspirar novos processos descentralizados, e contextualizados às dinâmicas dos territórios, e partilhar estratégias metodológicas que potencializem a Agroecologia enquanto ciência, prática e movimento.
Esperamos que esse esforço inicial possa ganhar contornos mais tranquilos de debate e revisão. E, neste sentido, convidamos, à todas as pessoas associadas, parceiras e demais colaboradores à navegar pelo conteúdo também buscando adaptá-lo, qualificá-lo e, principalmente, estimulando espaços de revisão e amadurecimento onde possamos sedimentar melhor as concepções que, neste constante fluxo, ainda carecem de tempo para exercitarmos lugares comuns.
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Boa leitura!
Presidência e Equipe do Projeto Desaguar