Congresso de agroecologia em Belém discute desafios à soberania

Mesa de abertura do IX CBA (Fotos: Ronaldo Rosa)

Luta e esperança deram a tônica do início dos trabalhos do IX Congresso Brasileiro de Agroecologia nesta segunda-feira (28), no Hangar, em Belém/PA. Os dois elementos estiveram presentes na apresentação de uma mística e nas considerações dos membros da mesa de abertura. O evento reúne mais de 3,1 mil participantes e dois eventos paralelos, o VI Seminário Estadual de Agroecologia e VII Encontro Nacional dos Grupos de Agroecologia (Enga), este, na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra).


A presidente da Associação Brasileira de Agroecologia, Irene Cardoso, saudou o fortalecimento do evento e chamou atenção aos desafios para a construção de um futuro mais promissor para o país, a partir da proposta agroecológica. “Temos aqui mais de 1400 trabalhos que expressam a contribuição de estudantes, agricultores, quilombolas, ribeirinhos, indígenas e povos tradicionais na construção do conhecimento agroecológico”, disse.

Representando a Via Campesina, Rogério Hohn, ressaltou que a agroecologia não é apenas um debate técnico, mas a luta por um projeto diferenciado de sociedade. “Apostamos na agroecologia enquanto experiência concreta de vida, experiência concreta de resistência”, afirmou.

Também estiveram presentes na mesa de abertura, o secretário de estado de desenvolvimento agropecuário e da pesca Hildegardo Nunes, e representantes da Embrapa, Emater, IFPA, UFPA, Ufra, Museu Goeldi e demais entidades que coordenam o evento.

O professor mexicano Narciso Barrera-Bassolsar fez a conferência de abertura

Biocultural – A conferência de abertura coube ao professor mexicano Narciso Barrera-Bassols, da Universidade Nacional Autônoma do México, sob o título “O paradigma Biocultural: diversidade e soberania na construção do bem viver”. De acordo com o professor, o paradigma biocultural considera que a diversidade biológica e a diversidade cultural são mutuamente interdependentes e geograficamente coexistentes. “Não há cultura sem natureza nem natureza sem cultura”, disse.

Postos em perspectiva, a humanidade e sua história moderna (últimos 300 anos), representam uma ínfima parte de um planeta que existe há 4 bilhões de anos e é habitado por milhões de espécies de seres vivos. Mas Narciso considera que esses últimos três séculos causaram uma perturbação no meio ambiente sem precedente. “Somos uma espécie muito depredadora. Vivemos uma crise civilizatória que se assemelha a um clima de fim de festa, pois consumimos de forma desmedida os recursos naturais”, comparou.

A esperança de superação dessa crise é depositada pelo professor na agroecologia, pois essa se constitui como um registro da experiência
humana no planeta que transcende em muito os três séculos de conhecimento científico gerados pela era moderna.

As práticas dos diferentes povos com a diversidade biológica formam o que Narciso chama de memória biocultural. “Em algum momento o cérebro humano propiciou a criação da palavra e com ela a comunicação e a construção da memória”, disse. E a Amazônia seria um dos grandes centros de diversidade biocultural. “Se há mais de 400 povos na Amazônia, há mais de 400 agroecologias”, afirmou. Para o professor, é nessa disciplina que deve ser buscada a saída para a crise civilizatória, pois ela acumula experiências que remetem há 10 mil anos, quando da invenção da agricultura.

Narciso enfatiza, no entanto, que a agroecologia não pode ser tratada como uma solução meramente técnica. “Pois não há soberania alimentar sem soberania territorial”, finalizou.

Vinicius Braga – MTb 12.416/RS

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