“VI ENCONTRO NACIONAL DE GRUPOS DE AGROECOLOGIA”

Semear a liberdade, auto gerir, assumir a responsabilidade individual, desconstruir
paradigmas e arregaçar as mangas para construir um todo que acolha, respeite e aprenda
com a diversidade. Respeitar a liberdade de cada um. Re-significar o olhar acerca de
como as coisas podem ser nesse mundo, perceber nossos padrões, escolher e re-existir.
“Sê Mentes Livres – Re-Existência”, este foi o tema do VI ENGA (Encontro Nacional
dos Grupos de Agroecologia), que aconteceu do dia 12 a 16 de novembro de 2014 na
EcovilaTibá, em São Carlos – SP.

O ENGA é um encontro construído pela REGA (Rede de Grupos de Agroecologia do
Brasil), uma rede que nasce de grupos e indivíduos que praticam a agroecologia e, a
partir de uma tomada de consciência, percebem que se ver no outro pode fazer a
diferença para o mundo que acreditam, fortalecendo assim a construção desse
movimento de transformação.

O processo de construção do evento é uma forma da REGA materializar seus objetivos
de incentivar a emancipação e autonomia do ser humano, de qualquer forma de
dominação e opressão que os tabus alimentados pelo sistema capitalista têm exercido na
sociedade. Para isso cultivamos a cultura de paz, e o estímulo a uma vida mais integrada
a natureza. Como ferramentas para isso, praticamos a Permacultura, a Comunicação
Não-Violenta e estimulamos o desenvolvimento local agroecológico partindo da
autogestão e da horizontalidade.

No V ENGA, em Porto Alegre-RS, uma semente foi semeada e, a partir daí, sob os
cuidados dos grupos de São Paulo o VI ENGA começou a germinar. Para cultivar essa
semente os grupos da região de São Paulo se uniram e muitas mãos, mentes e corações
trabalharam. Este tipo de articulação regional contribuiu para o evento, e como
consequência os grupos do estado estão agora mais fortes.

Em junho de 2014 ocorreu o Sementário da REGA, em Antonina-PR, com a presença
de grupos de quase todas as regiões do país e foi fundamental para que o acúmulo
político da rede entrasse em sintonia com a construção do encontro. De lá saíram muitos
encaminhamentos metodológicos, além de muitos sonhos que viriam a ser realizados.
A agroecologia nos ensina que plantar com amor sempre nos trará bons frutos, então
não poderia ser diferente. Com muito envolvimento e a partir de metodologias
participativas, nos encontramos periodicamente para regar, adubar e energizar esta
planta que pouco a pouco vinha crescendo.

Um grande fruto deste trabalho é o cuidado para que o ENGA fosse um evento
realmente coerente, aproximando o discurso da prática. A alimentação foi originada em
sua maioria da agricultura familiar, dos grupos de agroecologia e de assentamentos da
reforma agrária, gerando renda para a comunidade e nutrindo as pessoas de saúde e energia vital. Todos os produtos de higiene foram fabricados com bases ecológicas, sendo disponibilizados para todos os participantes. Sabonetes, pó e enxaguante dentais,
shampoo, entre outros.

Os resíduos gerados foram tratados coma utilização de banheiros secos, além da
separação dos recicláveis e compostagem dos resíduos orgânicos. A água também
recebeu sua devida atenção. Os chuveiros e torneiras foram abastecidos com água da
chuva, através de uma cisterna de captação construída para o encontro.

A união entre prática e teoria também se deu nas oficinas que foram organizadas de
acordo com as sete pétalas da Permacultura. Educação popular, reforma agrária,
agricultura biodinâmica, bioconstrução, manejo dos recursos hídricos, biodiversidade, e
a valorização da cultura popular foram alguns dos temas aprofundados por focalizadores
que vieram de diferentes partes do Brasil com importantes conhecimentos para serem
compartilhados.

O encontro acolheu a todos, crianças de todas as idades, desde os bebês de poucos
meses até mestres vivos que nos deram o ar da graça. As crianças contaram com o
cuidado de todos e tiveram um espaço próprio para elas, o Enguinha.
A valorização da diversidade cultural é outro ensinamento da agroecologia e que foi
muito honrado nas culturais do encontro, com lindas e empolgantes apresentações. Toda
a cerveja oferecida nessas atividades foi de origem artesanal, sem transgênicos,
produzidas por grupos autônomos ligados a rede.

Outro momento especial, sempre muito marcante nos espaços da REGA, foi a feira de
troca de sementes que incentiva a conservação da diversidade. Com muita música e
cultura, muitas variedades de sementes foram trocadas e compartilhadas, culminando
em um mutirão para plantar um banco vivo de sementes e nos reconectar com a
ancestralidade e os ensinamentos da Mãe Terra.

No encontro tivemos a oportunidade de fortalecer nossos laços com a ABA (Associação
Brasileira de Agroecologia) e a ANA (Articulação Nacional de Agroecologia), com a
realização de uma mesa redonda com representantes de ambas asorganizações, abrindo
novas perspectivas para inserção política dos grupos de agroecologia. Diversas
propostas foram feitas no sentido de possibilitar o acesso às políticas públicas e editais
de financiamento, assim como para criar acúmulo e contribuir para o aperfeiçoamento e
criação de novas políticas.

Foi ressaltada a importância dos grupos na formação profissional diferenciada e no
trabalho direto com os agricultores, povos indígenas e comunidades tradicionais. Nesse
sentido gostaríamos de enfatizar o nosso respeito pela luta de cada um desses povos e
firmar nossa participação para que seus direitos sejam garantidos em nossa sociedade.
Os recursos financeiros utilizados para a construção do encontro foram viabilizados
pelo valor levantado nas inscrições, doações de grupos que compõe a rede e por uma
campanha de financiamento colaborativo, da qual somos muito gratos. Por fim, em plenária histórica realizada no encontro, foram tirados os seguintes encaminhamentos do VI ENGA:

-Fortalecer, dar continuidade e multiplicar as campanhas da REGA como o Maio
Agroecológico, o Plante o ENGA, o Sementário, as Caravanas Agroecológicas, as
Micorrizas e as Feiras de Trocas de Sementes.
-Apoiar as seguintes causas: campanha permanente contra o uso dos agrotóxicos e pela
vida; a construção do pós-capitalismo; reforma agrária popular; demarcação das terras
indígenas; uso sustentável dos recursos hídricos; igualdade de gênero;
descriminalização da Cannabis; apoio às ocupações urbanas e rurais; apoio ao exôdo
urbano; economia solidária e consumo consciente; agricultura urbana; direito dos
animais; desmilitarização da polícia; democratização dos meios de comunicação;
igualdade racial; parto humanizado; apoio à luta LGBTQI.
-Sistematizar e compartilhar saberes entre indivíduos e grupos de forma a facilitar ações
de apoio mútuo.
-Proporcionar a integração e a presença de povos indígenas e tradicionais no movimento
agroecológico, reconhecendo sua importância na resistência cultural, territorial e na
contribuição para a conservação da sócio-biodiversidade.
-Aprofundar nosso debate sobre educação popular emancipatória e agroecologia,
problematizando a atual educação formal em agroecologia.
-Debater na REGA a nossa concepção de Agroecologia para aprofundar o diálogo com
as diferentes concepções nos movimentos sociais.
-Estudar e nos capacitar com metodologias de gestão participativa para a estruturação da
REGA.

Temos consciência dos desafios que nos são apresentados, numa sociedade marcada
pelas relações regidas por tabus, crises humanas e por uma governança pautada na
representatividade verticalizada da qual ainda estamos dependentes. Esperamos que a
experimenta-açãodo encontro reverbere nos indivíduos e grupos de agroecologia nas
práticas cotidianas, funcionando como um fractal da mudança que queremos para o
mundo.

São Carlos, 16 de novembro de 2014.

Atenciosamente,

REGA (Rede de Grupos de Agroecologia do Brasil)

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