Começou com muita animação o I Encontro Mineiro de Agroecologia, realizado em Belo Horizonte, entre os dias 30 de setembro e 02 de outubro. Ao som de Sebastião Estevão, mais conhecido como Farinhada, agricultor e agitador cultural da zona da mata mineira, as comitivas somando cerca de 200 participantes foram recepcionadas. O objetivo do encontro é discutir avanços para a agroecologia em Minas Gerais e o papel do estado nessa transição.
Agricultores, acadêmicos, indígenas, lideranças e gestores, dentre outros setores, homenagearam o professor Carlos Alberto Mazzetto, vulgo Mazan, e o sociólogo Júlio Cesar Gomes, pelos seus trabalhos em defesa da agroecologia na região. Ambos morreram recentemente devido a problemas de saúde, e são referências para a agricultura familiar e os movimentos no estado.
Há quase trinta anos foi realizado o I Encontro Estadual de Agricultura Alternativa, em 1986, contextualizou Edmar Gadelha, Subsecretário de Agricultura Familiar (SEAPA) em Minas. Desde então a construção das redes e do conhecimento agroecológico no estado vem se fortalecendo.
“Embora timidamente já é um passo importante nessa construção, pensar num outro modelo de desenvolvimento sustentável com a agroecologia no estado. Os estudiosos estão colocando que se não avançar nesses temas e circuitos curtos, não vamos conseguir. Pensar a transição do agroquímico para o sistema agroecológico e orgânico”, complementou.
Representando a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), Eugenio Ferrari resgatou o processo do campo agroecológico a partir do I Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), realizado em 2002, no Rio de Janeiro. A partir desse momento, segundo ele, a hipótese de que existiam muitas experiências agroecológicas espalhadas pelo país se confirmou.
“O encontro construiu uma identidade e forma de nos articulamos para ganhar expressão nacional. No II ENA fizemos a demarcação do agronegócio e mostramos como a agroecologia estava sendo construída, e agora estamos construindo o III ENA. O Encontro Mineiro faz parte desse processo de preparação. No final de maio fizemos a caravana na zona da mata, e teremos o encontro norte mineiro. Esses eventos capilarizam debates sobre diferentes temas que promovem a agroecologia. Temos o desafio de demonstrar para a sociedade por que ela tem que apoiar a agroecologia e as comunidades tradicionais”, disse.
O deputado federal Adelmo Carreiro Leão (PT-MG), representando a Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, lembrou o Projeto de Lei 177 do deputado Rogério Correia, que está em tramitação. De acordo com o parlamentar, esse projeto é fruto do trabalho de muitas mãos que estão comprometidas com a construção da agroecologia.
“Alguns desafios permanecem, embora não seja uma questão só de governo. O desafio na construção de uma política está ligado a reforma agrária, que ainda não aconteceu no Brasil. Não podemos admitir uma reforma agrária transformando a terra do povo em instrumento de mercado. A terra é um instrumento da vida para aqueles que nela trabalham”, afirmou.
Pensar em qual desenvolvimento queremos e uma alimentação saudável foram algumas das sugestões de Dom Mauro Morelli para as atividades do Encontro. “Nossa educação não só no campo está superada, e deve ser trabalhada dentro de cada bioma. Há um binômio indissolúvel de educação e nutrição: é impossível percorrer processos de aprendizado sem estar bem nutrido. Vamos promover um Simpósio Internacional em 2014 sobre a situação nutricional e alimentar do nosso povo voltado para os objetivos do milênio que não serão atingidos. Estamos com 1 bilhão de famintos no mundo, segundo a FAO, e não conseguiremos reduzir pela metade até o dia 16 de outubro de 2015”, criticou o bispo.
A reforma agrária continua sendo uma das principais bandeiras dos movimentos, reforçou Felipe Russo, da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ele saudou a dedicação e sacrifício dos participantes que deixaram suas roças, tribos e quilombos para participar do encontro. São eles, na sua visão, que constroem a verdadeira agroecologia.
“O encontro qualifica ainda mais a nossa luta, e o maior desafio é fortalecer esse processo independente da trincheira. Temos que dialogar para quem não está no campo. O capital e o agronegócio estão fazendo disputa com os nossos recursos naturais, e ainda que pequena nossa agroecologia serve como controle e resistência nos territórios. A reforma agrária tem que ser colocada, pois a agroecologia é incompatível com o latifúndio. E precisamos avançar na escala da produção de alimentos, é uma tarefa para nós de Minas e do encontro”, observou.
O integrante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), Josuleno Anacleto, disse que o encontro é um “momento muito rico para pensarmos nas nossas estratégias no estado, avanços e desafios na agroecologia. Os desafios do acesso a terra, e uma política estruturante para o setor. O olhar tímido ou até insignificante do governo, dado o tamanho e importância do movimento agroecológico”, ressaltou.
Outra pessoa homenageada que também faleceu recentemente foi José Antônio Costabeber, presidente da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA). A atual vice-presidente da instituição, professora Irene Cardoso, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), ressaltou sua importância junto ao estudioso Francisco Caporal na academia. “A ABA faz parte da ANA, organiza a agroecologia enquanto ciência. Mas sempre no movimento e na prática tem a ciência. Aqui fizemos o encontro com todos envolvidos, como deve ser feito”, destacou.
Na parte da tarde ocorreram as Instalações Pedagógicas, salas onde os grupos regionais colocaram suas fotos, sementes, artesanatos e histórias. No caso do Vale do Jequitinhonha, por exemplo, os agricultores mostraram a forte cultura local e vários desafios nos territórios, como o acesso a terra e as dificuldades para comercialização. O dia encerrou com a abertura da feira de saberes e sabores e a apresentação cultural de Rubinho do Vale, músico mineiro.
Fonte: ANA. Fotos: Rodrigo Carvalho/CTA-ZM.