Evento foi realizado na manhã desta quarta, 27, na UFS, e reuniu pesquisadores/as, estudantes e representantes de movimentos sociais da agroecologia em Sergipe
“Sem tocar o coração das pessoas,
não podemos fazer grandes mudanças”
(Peter Rosset)
A poucos meses da realização do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA) na cidade de Aracaju, em Sergipe, a Mesa Redonda “Os desafios da construção da agroecologia na contemporaneidade” movimentou pesquisadores/as, estudantes e representantes de movimentos sociais na manhã desta quarta, 27, na Universidade Federal de Sergipe (UFS).
Frente ao aprofundamento do neoliberalismo e ao avanço da bancada ruralista nos espaços de decisão política, o evento compõe o processo preparatório para o CBA e se destaca como etapa fundamental do processo organizativo das famílias camponesas, tendo a agroecologia como horizonte na ciência, na prática e no movimento.
Conduzida pelo geógrafo e coordenador geral do Programa de Educação Ambiental com Comunidades Costeiras (PEAC), Eraldo Ramos Filho, a mesa redonda foi composta por nomes de extensa trajetória no movimento agroecológico nacional e internacional: Peter Rosset, da Via Campesina Internacional, Irene Cardoso, representando a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), e Jorge Rabanal, da Rede Sergipana de Agroecologia (Resea).
Processos político-pedagógicos
A partir de exemplos de prática agroecológica realizados em diversos países e que originaram resultados positivos impressionantes na agricultura familiar, Peter destacou a importância da territorialização e da autoorganização para a efetivação da agroecologia em diferentes lugares do mundo. “Um grande problema da agroecologia não é encontrar as práticas, é construir os processos. Por isso, é fundamental atentarmos para a necessidade de reforçar o protagonismo do camponês, e não do técnico extensionista, o intercâmbio e o diálogo de saberes, estimular canais de mercado diferenciados e reforçar as práticas protagonistas das mulheres e dos jovens”, destacou o representante da Via Campesina.
A importância de se apropriar da matriz produtiva para realizar as transformações agroecológicas nos territórios foi destacada por Peter a partir do exemplo de atuação do programa ‘Camponês a camponês: uma metodologia horizontal do processo social’ que, através da metodologia do ‘Inventário de problemas produtivos e de boas práticas agroecológicas”, conseguiu mobilizar a criatividade e o protagonismo camponês para a socialização das práticas agroecológicas’.
“A essência da metodologia é o momento pedagógico básico, que consiste em visitas a lotes de uma família que tem alguma prática agroecológica e que resolve problemas comuns entre outros camponeses. Dessa forma, não se depende de extensionistas e suas limitações na execução de programas e projetos. Atualmente, cerca de 50% da população de Cuba já faz agroecologia nos territórios a partir dessa troca de saberes. O camponês é o mestre, o professor. Seu sítio é a sua sala de aula”, complementou Peter.
Para Irene Cardoso, da ABA, um dos grandes desafios da agroecologia na contemporaneidade é construir uma nova ciência e políticas públicas coerentes com os desafios da prática agroecológica nos territórios. “A ciência que temos está intimamente ligada ao agronegócio e ao capital. O conhecimento produzido gira em torno de conhecimentos que vêm o território fragmentado e a partir de práticas nocivas não só à terra, mas também à vida humana. Um grande desafio para nós é construir processos políticos que subvertam os modos de fazer ciência, de criar e executar políticas públicas e sensibilizar os movimentos sociais para a centralidade da agroecologia nos processos de luta”, afirmou Irene.
“Promover a união entre os movimentos, mediando as divergências, sentir como a cultura se exerce em cada território nas festas populares, na religiosidade e em toda a sua grandiosidade é fundamental para fortalecer a agroecologia nos territórios. Ressignificar o trabalho, valorizar os mutirões e estimular nos jovens uma concepção mais ampliada de trabalho, que vai muito além do trabalho braçal na roça e envolve também um processo pedagógico que pode envolver os jovens também”, complementou Irene ao lançar reflexões sobre maneiras de mobilização nos territórios. Representando a Rede Sergipana de Agroecologia (Resea), Jorge Rabanal fez um breve mas rico resgate do movimento agroecológico e da sistematização das práticas em agroecologia no território sergipano. “Tem muita experiência maravilhosa na agroecologia em Sergipe e é importante sistematizar as práticas para fortalecer as lutas e resistências. É nos territórios, nos quintais e na cultura das pessoas que se conhece e se faz agroecologia”, destacou Rabanal.
Texto por Priscila Viana