A Associação Brasileira de Agroecologia – ABA, fundada em 2004 e composta por pesquisadores e pesquisadoras de diversas áreas do conhecimento científico, tem atuado ativamente na defesa e construção de sistemas produtivos de base agroecológica e de Produção Orgânica, bem como conhecimentos participativos no campo da agroecologiacomo bases para uma agricultura livre de agrotóxicos e transgênicos, visando a soberania nacional, a alimentação saudável e a promoção do bem viver.
Os estudos realizados por cientistas inseridos nos diferentes Grupos de Trabalho (GT’s) da ABA, corroborando observações e indicações práticas historicamente apresentadas por povos indígenas, populações tradicionais e camponeses, dispõem dados que questionam objetivamente os resultados da Agricultura baseada no uso de Agrotóxicos, assim como apresentam os impactos socioambientais deste modelo de produção agrícola. Em contrapartida, temos apresentado também resultados alavancados pelos princípios da Agroecologia e seus benefícios para agricultores, consumidores e processos relacionais.
Acreditamos que a Agroecologia oferece chaves para a construção de um novo paradigma de produção e vida no campo e na cidade. É essencial, nesse sentido, a construção de instrumentos que efetivamente controlem ou proíbam o uso de agrotóxicos no país. O uso de agrotóxicos para além dos amplos impactos já revelados sobre a saúde de trabalhadores e da população de forma geral, tem dificultado (e às vezes impossibilitado) o pleno desenvolvimento de sistemas produtivos altamente eficazes e respeitosos ao meio ambiente pautados pela Agroecologia.
A pulverização de agrotóxicos e, especialmente, a pulverização aérea de agrotóxicos impacta diretamente a saúde e o ambiente. Casos como o ocorrido em 3 de maio de 2013, quando 92 pessoas (a maioria crianças e jovens) foram pulverizadas por aeronave agrícola na Escola Municipal São José do Pontal, no município de Rio Verde-GO, se repetem cotidianamente em várias partes do país, atingindo povos indígenas, populações tradicionais, camponeses e populações urbanas, como ocorreu em Lucas do Rio Verde-MT, quando a cidade foi completamente afetada pela deriva de agrotóxicos pulverizados de forma aérea.
Não é possível o uso seguro de agrotóxicos, todavia, quando a aplicação ocorre pela via aérea a dispersão de tais produtos no ambiente são ainda maiores e mais danosas. Estudo da EMBRAPA* já mostrou que os equipamentos de pulverização, ainda que calibrados, sob temperatura e ventos ideais, permitem que somente 32% dos agrotóxicos vomitados por aeronaves sejam retidos nas plantas “alvo”, sendo que 19% migram pelo ar, para áreas circunvizinhas da aplicação; 49% vão para o solo e, após algum tempo, da parte que evapora uma parcela retorna em forma de chuvas, da parte que é lixiviada quase a totalidade contamina lençóis freáticos e apenas pequena quantidade se degrada, muitas vezes gerando produtos de maior toxicidade, como no caso do AMPA, principal metabólito do glifosato. A deriva técnica de agrotóxicos chega a atingir distâncias que vão além dos 30 km do local da pulverização, contaminando amplamente a natureza e impossibilitando o desenvolvimento de vida saudável, naqueles ambientes.
A ABA-Agroecologia parabeniza e destaca a importância da aprovação, pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 18 de dezembro de 2018, bem como de sanção do governador Camilo Santana (PT/CE), em 8 de janeiro de 2019, para o Projeto de Lei 18/2015 (de autoria do Deputado Renato Roseno – PSOL/CE), que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no Estado do Ceará.
Trata-se de medida inédita em nosso país, de grande relevância para a vida e o futuro de nossa gente, merecendo o aplauso e o reconhecimento desta e das próximas gerações. Em nosso entendimento este passo colabora com a democracia, garante a defesa dos direitos humanos e protege as gerações futuras, constituindo exemplo a ser seguido em todos os rincões do país.
Certamente os setores organizados do agronegócio, em especial aqueles dependentes da pulverização aérea de agrotóxicos, irão buscar reverter essa importante conquista. Por isso é extremamente necessário que a sociedade se mobilize para dar apoio e garantir medidas que, como a proibição da pulverização aérea no Ceará, sejam acompanhadas de outras ações estatais apoiadas nos princípios da agroecologia com vistas a produção de alimentos saudáveis, de forma respeitosa aos direitos humanos e em quantidades suficientes para a realização da soberania alimentar em nosso país.
Compartilhamos a nota de apoio, na íntegra, para download no link abaixo.
* CHAIM, A. Tecnologia de aplicação de agrotóxicos: fatores que afetam a eficiência e o impacto ambiental. In: SILVA, Célia Maria Maganhotto de Souza; FAY, Elisabeth Francisconi (Orgs.). Agrotóxicos & Ambiente. Brasília: Embrapa; 2004.