Por Irene Cardoso, presidente da ABA e professora da UFV
Ocorreu nos dias 18 e 19/09, em Roma, o Simpósio Internacional de Agroecologia para a Segurança Alimentar e Nutricional, organizado pela FAO, com a participação de mais de 400 pessoas (dados da FAO).
A definição de agroecologia adotada pela FAO, a partir do acordo com o comitê científico que ajudou na preparação do evento, foi a do Prof. Gliessman: agroecologia é um estudo integrado da ecologia de todo o sistema alimentar, abrangendo as dimensões ecológicas, econômicas e sociais. O foco da agroecologia é trabalhar com e entender as interações entre plantas, animais, ser humano e o ambiente com os sistemas agrícolas. Ao trazer os princípios ecológicos para sustentar os agroecossistemas, através da intensificação ecológica pode se identificar inovações nos manejos, baseados em interações chaves e no fortalecimento de ciclos virtuosos na produção agrícola que de outra forma não seriam considerados (tradução livre).
Na oportunidade estive presente e apresentei a palestra: People managing landscapes and watersheds: agroecology and social processes (Pessoas manejando paisagens e bacias hidrográficas: agroecologia e processos sociais). Fiz parte também do comitê científico do evento. Fui convidada por ser cientista e também por ser presidente da ABA, isto é mais uma demonstração do respeito que a ABA possui não só no Brasil, mas também internacionalmente. O evento contou com diversas palestras e apresentações de experiências. Outros brasileiros como Celso Marcatto da Actionaid Brasil, Marilene Alves de Souza (Leninha) do CAA (Centro de Agicultura Alternativa do Norte de Minas), Iracema Ferreira de Moura da Secretaria da Presidência, Marciano Silva (Via Campesina) estavam presentes, além do staff da FAO, que conta atualmente com vários brasileiros, entre eles Cleyton Campanhola, ex presidente da Embrapa e que foi um dos organizadores do evento. Iracema??? participou de uma mesa redonda e apresentou a experiência da PNAPO/CNAPO (Política e Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica). Leninha apresentou experiência da ASA. Na última sessão do evento, ministros ou representantes de vários países também falaram um pouco da experiências de seus respectivos países. O Ministro do Desenvolvimento Agrário não pode estar presente mas enviou uma mensagem por vídeo que foi apresentada no evento. O evento foi encerrado pelo presidente da FAO, o brasileiro José Gaziano da Silva. A programação completa do evento está disponível em http://www.fao.org/fileadmin/user_upload/faoweb/docs/afns/afns-Agenda-EN.pdf.
A Socla (Sociedade Latino Americana de Agroecologia) estava também representada (Clara Nichols e Miguel Altieri, dentre outros) e apresentaram um documento sobre a percepção da Sociedade sobre agroecologia, intitulado “Agroecology: concepts, principles and applications (vide anexo).
Desde o início, os organizadores do evento deixaram claro que sofreram pressão de alguns Estados membros da FAO para não realizar o evento. O contra argumento para realizar o evento foi de que a FAO deve promover e estar aberta ao diálogo. Entretanto, deixaram claro que o simpósio (e os palestrantes) deveriam focar na dimensão científica da agroecologia! Após o evento, a SOCLA preparou um documento apresentando suas reflexões sobre o evento. A ABA concorda com as reflexões da SOCLA (vide anexo).
Na penúltima sessão do evento, o Professor Steven Gliessman fez uma síntese do evento. Deixando registrado que agroecologia é ciência, movimento e prática, e que nós (na fala de Gliessman), precisamos das três dimensões. Estas três dimensões foi colocada por mim em minha palestra. A SOCLA, também em seu documento final, e a atual diretoria da ABA também assumem a agroecologia como sendo ciência, movimento e prática.
Na fala de encerramento o Graziano expressou de forma clara que aquele evento era uma janela aberta na FAO, a “catedral da revolução verde”, e que a agroecologia é uma possibilidade real de produzir alimentos de uma forma mais sustentável. Entretanto, o mesmo também falou que há espaço para todos, inclusive para os transgênicos. Ou seja, como dizemos no Brasil: “é uma no cravo e outra na ferradura”! A SOCLA, assim como a Via Campesina, apresentam seus argumentos a este respeito. Veja o documento da Via Campesina publicada com o título “Today a window was opened in what for 50 years has been the Cathedral of the Green Revolution” (http://viacampesina.org/en/)
Gliessman, em sua fala final, também soliciou que a FAO continue o debate e que continue fortalecendo a agroecologia (veja em anexo). Graziano prometeu levar a agroecologia para o evento da ONU sobre mudanças climáticas que ocorreria. Este evento ocorreu na semana seguinte e Graziano disse que: “Last week an international technical symposium on Agro-ecology took place at the FAO Headquarters in Rome, and it was attended by over 400 scientists, governments and non-state representatives. They called for an UN System-wide initiative on Agro-ecology as an element to sustainably promote food security, address climate change, and build resilience.”
Uma forma de continuar o debate proposta pela FAO foi a organização de três eventos regionais sobre a agroecologia. A embaixadora do Brasil na FAO fez uma fala onde o Brasil se compromete a organizar, em 2015, o evento Latino Americano. A SOCLA conversou conosco propondo que o evento seja realizado na Argentina, junto com o Congresso da SOCLA. Em reunião, a diretoria da ABA posicionou-se favorável ao evento e colocou-se à disposição para ajudar em sua organização, na Argentina ou em outro país, mas também pensa que o evento poderia ser realizado no Brasil.
Por fim, gostaria de socializar o site da OXFAM sobre o evento e que realçou o dado apresentado por mim de que nós brasileiros utilizamos em média 5 litros de agrotóxicos por ano (http://politicsofpoverty.oxfamamerica.org/2014/09/fao-sends-message-global-need-agroecology/). Esta informação foi uma surpresa e chocou muitos dos presentes.
Aproveitamos aqui a oportunidade para reafirmamos nossa luta contra os agrotóxicos e os transgênicos e nos posicionamos contra a ideia do uso seguro destes venenos e dos níveis aceitáveis de contaminação; pedimos o fim da pulverização área e o banimento dos agrotóxicos proibidos em outros países; exigimos o fim da isenção fiscal aos agrotóxicos e a destinação dos recursos arrecadados para o fortalecimento da agroecologia e a recuperação de ecossistemas degradados.